(David Allan, O casamento das montanhas, 1780) |
Nem sempre o indivíduo foi entendido enquanto um ser autônomo, possuidor de uma subjetividade, que podia entender o mundo partindo de sua ótica, fazer escolhas por conta própria, se responsabilizar por suas escolhas e ser.
Autonomia é um termo de origem grega, que significa aquele que estabelece as próprias leis. A palavra vem de auto, que significa "por si mesmo" e nomos, que significa "lei". Trata-se de um conceito que determina a liberdade do indivíduo para gerir livremente a sua vida, vivenciando suas próprias escolhas.
Foi numa época muito recente, em especial no período da Idade Moderna em diante, que a subjetividade passa a ser entendida como uma forma de consciência do indivíduo sobre si mesmo, sobre sua própria consciência, o que antes era impensável na Idade Média.
Na Idade Média, a consciência de cada pessoa era resultante de uma relação com os poderes, sejam estes o divino-religioso ou o rei-Estado. A consciência era resultante, portanto, de um entendimento coletivo que não refletia sobre si mesma, não era um produto individual, mas coletivo.
Com as diversas mudanças que ocorreram durante o Renascimento, como o surgimento da imprensa, que favoreceu a leitura individual, a Reforma Protestante, contestando a unidade da doutrina católica, o desenvolvimento da burguesia, ampliando o comércio e o contato com regiões distinta, as navegações, que possibilitaram o contato com outros povos, entre outras, possibilitaram um sujeito mais individualizado, que agora passava a questionar sobre si mesmo.
Neste período surge então a consciência moral, a consciência da pessoa consigo mesma, em sua experiência de subjetividade. O eu pessoal passa a ser entendido como resultante das vivências do indivíduo, fruto de sua relação com o mundo e com as outras pessoas, e não mais como um mero resultado de uma ordem coletiva.
A consciência moral corresponde ao modo como uma pessoa se posiciona pessoalmente diante dos julgamentos sociais, sua relação com o Estado, seus direitos e deveres, valorando e assumindo escolhas e se responsabilizando por elas.
Diante deste percurso histórico foi-se constituindo o sujeito do conhecimento, que corresponde a consciência enquanto uma capacidade de entendimento, análise, síntese e representação, que se distingue dos objetos, atuando sobre eles em nível intelectual e conceitual, estabelecendo significações, juízos, ideias e teorias.
Este corresponde na capacidade humana de conhecer, estabelecer e valorar, que começa a se desenvolver no início da Idade Moderna, juntamente com as transformações econômicas, sociais e culturais da época. Enquanto o eu pessoal singulariza o indivíduo, o eu moral e o sujeito do conhecimento seguem para a universalidade dos julgamentos e conhecimentos, envolvendo noções gerais sobre bem e mal, justo e injusto, certo e errado, etc.
Neste período o homem começa a ser entendido como autor de suas ideias e de suas ações, de modo que a filosofia moderna se desenvolve partindo nesse entendimento sobre a subjetividade, acreditando na possibilidade do ser humano natural, da criança se desenvolver até se tornar um adulto consciente de seus pensamentos e controlador de sua vontade e de seus atos.
Esta perspectiva cumina numa concepção Iluminista de sujeito que, no século XVIII, entendia que era possuidor de autonomia e de autodeterminação, entendendo este como naturalmente livre e moralmente controlado. Porém esse entendimento passa a se tornar um problema no período contemporâneo, quando as bases do humanismo começam a ser questionadas.
Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica.
Referência:
ARANHA, Maria Lucia de Arruda. História da educação. 2 ed. São Paulo, Moderna, 1996.