Kant e os limites do conhecimento

O filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) é considerado um dos mais importantes do Iluminismo alemão, além de um dos maiores filósofos do modernismo. Antes dele entendia-se que o conhecimento era orientado a partir do objeto, diferindo dessa perspectiva, Kant defendeu que os objetos são regulados a partir das formas a priori de nosso entendimento.

Enquanto filósofo do Iluminismo, Kant destacava o otimismo com relação à ideia do ser humano ser orientado pela própria razão, de maneira autônoma, ao invés de ser guiado por crenças, tradições e opiniões alheias. Porém, essa razão deveria ser colocada em questão para que não fizesse o mal uso da mesma, sobretudo com relação à sua extensão e seus limites.

Em sua filosofia, ele operou um exame crítico da razão, questionando a possibilidade de uma "razão pura" independente das experiências, refletindo sobre o que pode ser conhecido e investigando, e as condições onde se dá o conhecimento. Sua filosofia tentou responder questões como: O que podemos conhecer? Como devemos agir? O que podemos esperar? O que é o ser humano?

Para Kant, o processo de ilustração corresponde à saída do ser humano de sua "menoridade" para alcançar a "maioridade", comparando ao momento em que a criança cresce e amadurece, consciente de sua força e da possibilidade de se alcançar a autonomia no uso da razão, livre para fundamentar sua própria maneira de agir, sem a tutela ou direcionamento de outrem.

"A atitude crítica, para se manter, precisa reconhecer os limites da razão. Sem essa consciência, a razão pretender-se-á onisciente e onipotente, tornando-se dogmática e autoritária, perderá seu necessário vínculo com a liberdade e se converterá em irrazão, sob a ilusão de parecer conhecer e de parecer racional."
(Rohden, 1998)

Tentando responder ao problema do conhecimento, entre os racionalistas e empiristas, o filósofo estabeleceu diferenças entre o conhecimento a priori, dito "puro", que não depende da experiência dos sentidos, sendo inclusive anterior à experiência, fundamentado na operação racional; do conhecimento a posteriori, que é o conhecimento empírico, que provém da experiência por meio dos dados dos sentidos.

O conhecimento a priori, ou "puro", seria entendido um conhecimento necessário e universal, onde suas afirmações devem ser válidas independente das experiências anteriores ou condições específicas. Esse conhecimento puro conduziria aos juízos universais e necessários, diferente do conhecimento empírico, a posteriori, que seria apenas resultante de contingências e condições específicas.

Kant diferenciou também dois tipos de juízos que fazemos das coisas. Um deles, o juízo analítico, onde predicado já está implicado no conceito do sujeito, como quando dizemos que o círculo é redondo ou que o quadrado tem quatro lados iguais, onde "ser redondo" ou "ter quatro lados iguais" é uma qualidade implícita do sujeito, que não necessita ter a experiência do mesmo para se constatar.

O juízo sintético acontece quando o predicado não está contido no conceito de sujeito, mas passa a ser incluído a partir da experiência, onde se acrescenta no sujeito algo de novo, como quando dizemos que uma mesa é branca, ou que uma cadeira é confortável. Neste sentido "branca" e "confortável" são características que não estão implícitas no sujeito "mesa" ou "cadeira", mas dependem da experiência para tal constatação.

Em seus estudos sobre as condições de conhecimento, Kant constatou a existência de formas a priori da sensibilidade, que possibilitam as experiências, e formas a priori do entendimento, que possibilitam os entendimentos. Para ele, todo conhecimento acontece a partir de formas a priori, as da sensibilidade são o espaço e o tempo, e as do entendimento são organizadas de acordo com categorias como causa, necessidade, relação, entre outras.

Deste modo, o conhecimento seria resultante de uma interação entre o sujeito que conhece, a partir de suas estruturas e categorias a priori, e o objeto conhecido. Kant constatou que não conhecemos as coisas em si mesmas, independente de nós, mas conhecemos apenas as coisas do modo como as percebemos, de acordo com nossas estruturas a priori da sensibilidade e do entendimento.

"(...) para conhecer as coisas, precisamos ter delas uma experiência sensível; mas essa experiência não será nada se não for organizada por formas da nossa sensibilidade, as quais são a priori, ou seja, anteriores a qualquer experiência. Assim, para conhecer as coisas, temos de organizá-las a partir da forma a priori do tempo e do espaço."
(Aranha & Martins, 1993)

Para Kant, não é possível conhecer as coisas em si. O noumenon (coisa em-si) não é acessível à consciência, podemos apenas conhecer os fenômenos (o que aparece), que corresponde as coisas do modo como aparecem para nossas estruturas de sensibilidade e de entendimento. A realidade não é um dado exterior, onde a razão deve se configurar e se sujeitar a ela, o mundo dos fenômenos só existe na medida que aparece para nós, portanto também participamos de sua construção.

Com suas colocações, o filósofo representou uma superação do impasse entre o racionalismo e o empirismo, propondo uma concepção onde o conhecimento seria resultante dessas duas condições, as racionais (a priori) e as empíricas (a posteriori), que depende da sensibilidade que nos oferece os dados dos objetos e do entendimento que determina as condições pelas quais os objetos são pensados.


Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica.

Referências:
ARANHA, Maria L.; MARTINS, Maria H. Filosofando: introdução à filosofia. 2ed. São Paulo: Moderna, 1993.
COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 2ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
ROHDEN, Valerio. O Criticismo Kantiano. In: REZENDE, Antonio (org). Curso de Filosofia. 9ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

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