A relação entre o terapeuta e a pessoa atendida, na perspectiva fenomenológico existencial, é fundamental para o processo terapêutico. Esta relação consiste no encontro entre duas pessoas, onde um profissional qualificado ajuda outra pessoa a tomar contato com sua existência, lidar com suas dificuldades e encontrar outros caminhos para a sua vida e dilemas.
Trata-se de uma relação humana, que consiste em reconhecer o outro como um indivíduo livre para fazer escolhas e estabelecer sentidos para sua vida, e aceitar este como outra pessoa, em sua diferenças e singularidades. Para isso, precisamos nos abrir à novidade, deixando de lado nossos julgamentos e pressuposições, reconhecendo o outro em suas singularidades e diferenças, com uma profunda consideração por seus modos de ser.
O contato com outra pessoa não é algo meramente racional, mas também afetivo, por isso o terapeuta deve possibilitar uma aproximação afetiva, acolhendo suas dores e alegrias, de modo a se aproximar da experiência do outro. Cada encontro que estabelecemos com outra pessoa é único, somos sempre transformados por esse encontro, mas para isso precisamos estar disponíveis para que esse contato com o outro nos atravesse a ponto de nos transformar também.
Muitas vezes, em vez de estarmos atentos ao que outro está nos dizendo, ficamos focados no que pensamos sobre o que a pessoa nos diz, assim nos voltamos para nossas experiências e pensamentos, deixando de tomar contato com o outro. Para nos aproximar do outro, precisamos nos deixar um pouco de lado, de modo a nos aproximar do modo de perceber, valorar e experienciar do outro, buscando entender como é viver a vida do outro sendo o outro.
Quando nos aproximamos de outra pessoa existencialmente e de maneira genuína, passamos então a nos preocupar por essa existência. Assim, a relação terapêutica na perspectiva fenomenológica tem muito mais um sentido de acompanhar a existência do outro, do modo como este sente e vive, sem tentar viver por ele ou orientar algo sobre seus modos de vida.
Se assim realizamos nossa aproximação com o outro, desenvolvemos um vínculo afetivo, tomando contato com as experiências subjetivas de uma pessoa, onde o terapeuta se dispõe a essa pessoa, usando sua sensibilidade, seus conhecimentos e habilidades de modo a ajudar esta pessoa a tomar contato com suas questões existenciais e seus dilemas, atuando como um facilitador do contato com sua existência.
Para que tudo isso seja possível, é primordial que a pessoa se sinta segura e à vontade para falar sobre si, sendo importante estabelecer uma experiência de confiança. Quanto mais a pessoa se sentir acolhida, mais fluido acontecerá o processo terapêutico, mais acessível será o contato com a experiência de sofrimento do outro. Assim deixamos a pessoa falar sobre o que deseja falar, em seu modo e seu tempo, utilizando perguntas abertas.
A perspectiva fenomenológico existencial privilegia a relação interpessoal em detrimento da teoria. O intuito da terapia consiste em tomar contato com os conflitos e dilemas da pessoa em atendimento, para que esta possa desenvolver outras perspectivas sobre sua existência e experimentar outros modos de vida. O terapeuta precisa estar disponível e interessado para o novo que surge na relação terapêutica, a experiência do outro, que é singular e própria.
O terapeuta nunca se coloca numa posição de superioridade para com a pessoa atendida, mas estabelece uma relação horizontal, buscando se aproximar desta pessoa em seu modo de encarar e viver a vida. Por isso, sua postura é muito mais de humildade para com outro ser humano onde, a princípio, não se sabe sobre, se abrindo a essa experiência do modo como se dá na relação terapêutica, sem utilizar as teorias para encaixar a pessoa, mas compondo o entendimento da existência do outro a partir do modo como essa pessoa se apresenta.
"Assim, o principal objetivo da psicoterapia existencial é proporcionar uma maximização da autoconsciência para favorecer um aumento do potencial de escolha; proporcionar uma ajuda efetiva ao cliente no sentido de descobrir-se e de autogerir-se; ajudá-lo a aceitar os riscos de suas próprias decisões responsáveis, enfim, aceitar a liberdade de ser capaz de utilizar suas próprias capacidades para existir."
(Thereza Erthal, em ‘Psicoterapia Vivencial)
A postura de humildade para com o novo é uma condição para que o terapeuta possa se aproximar da pessoa atendimento, buscando compreender a experiência singular do outro, considerando o que a pessoa diz, acolhendo com atenção à experiência que a pessoa está vivenciando num dado momento, respeitando a cadência de sua fala. Assim nos aproximamos dos distintos modos como experiencia sua vida, suas alegrias, suas dores e dificuldades.
Portanto, a relação terapêutica é uma relação humana que se constitui no encontro entre duas pessoas, no qual uma, enquanto terapeuta, preparado profissionalmente, acolhe com todo o respeito as experiências da pessoa em atendimento terapêutico, para que, por meio de sua fala, possa se aproximar de suas experiências, lidando com suas dificuldades e encontrando caminhos mais saudáveis para a sua vida.
A terapia fenomenológico existencial não oferece uma técnica que oriente como lidar com cada sintoma, mas direciona seu olhar para a existência em sua totalidade e em seu devir, realizando uma aproximação não teórica sobre a existência da pessoa, buscando restaurar o caráter criador de sua experiência, possibilitando que lide com seus dilemas, fazendo algo novo e criativo deles. Portanto, não se submete a pessoa num manejo teórico, pois assim se estaria deixando de reconhecer esta em sua singularidade.
Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica.